Valor Econômico, 19/03/2014, por Arícia Martins e Olivia Alonso | De São Paulo
Empresários e economistas presentes em evento promovido ontem pela revista "CartaCapital" reconhecem que a economia brasileira não vive um momento róseo, mas avaliam que a situação não seria a catástrofe que o mau humor recente dos mercados sugere. A antecipação do debate eleitoral, problemas de comunicação e a deterioração das contas públicas foram mencionados como motivos por trás do aumento do pessimismo com o Brasil, mas também foram destacados aspectos positivos da conjuntura atual.
Convidado às pressas pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para substituí-lo na abertura dos debates, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo afirmou que o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro não tem sido "uma maravilha" no período pós-crise, mas não está tão ruim se comparado a outras economias. O México, por exemplo, atual "queridinho" dos mercados, cresceu apenas 1,1% em 2013, ante expansão de 2,3% do Brasil, observou Belluzzo.
Segundo o economista, os países que tiveram recuperação muito acima da média após a crise financeira são justamente aqueles que não respeitam o tripé macroeconômico, formado por metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário: China, Índia e Indonésia. Belluzzo afirmou que não é contra o tripé, mas o considera um "fetiche".
Num painel cujos dados foram fornecidos por Mantega, Belluzzo ainda destacou a evolução dos investimentos no período de 2003 a 2012, quando a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e construção civil) aumentou 5,7% ao ano, em média, ao passo que a alta do PIB foi de 3,6% na mesma ordem. Em sua visão, a queda do custo relativo dos investimentos nos últimos anos seria outro ponto importante, que não é, no entanto, captado pelo IBGE.
Em seguida à apresentação de Belluzzo, a presidente da rede varejista Magazine Luiza, Luiza Helena Trajano, afirmou que o varejo brasileiro vive uma "década de ouro" e rebateu novamente a ideia de que existe uma "bolha" no mercado de consumo. "O Brasil tem mercado e todo mundo quer esse mercado", disse. Luiza também apontou que março tem sido um mês muito bom para a empresa e para o comércio como um todo.
Para o presidente da Vale, Murilo Ferreira, a maior desconfiança de investidores em relação ao Brasil foi impulsionada pela antecipação do debate eleitoral. Em discussão após as apresentações, Ferreira comentou que precisa fazer um curso de Ph.D. para explicar tudo que as pessoas perguntam a ele sobre o setor elétrico, mesmo trabalhando numa empresa do setor de mineração que produz 1,2 mil megawatts de energia para consumo próprio em seus projetos no país.
O empresário ainda relatou que, sempre que chega em algum banco, o primeiro ponto abordado pelos investidores são as finanças públicas. "Isso acontece, porque antecipamos a discussão eleitoral em dois anos", disse Ferreira. Segundo ele, existem notícias negativas, como o aumento do déficit em transações correntes e mesmo a piora das contas públicas, mas algumas informações têm sido discutidas num contexto eleitoral. O presidente da Vale ainda observou que há aspectos positivos no cenário atual, como o baixo desemprego e a renda real dos trabalhadores.
Luiza Trajano avaliou que o maior desafio do país para reverter a piora de sua imagem ainda é a comunicação. De acordo com a empresária, esse assunto foi tratado por ela recentemente com Mantega, a quem teria dito que a presidente Dilma Rousseff "precisa se comunicar".
Já para o presidente do grupo Caoa, Antonio Maciel Neto, outros dois fatores explicam o mau humor com o Brasil, além da piora da política fiscal: a questão da Petrobras e do setor energético. Sobre a estatal, Maciel Neto afirmou que o fato de a empresa ter feito "um mega-aumento" de capital e, em seguida, controlado os preços dos combustíveis não foi bem visto. Em sua avaliação, a mudança de um preço de patamar não pode ser considerada inflação, que seria um processo de reajuste constante dos preços.
Durante sua apresentação, Maciel Neto argumentou que a inflação elevada, o baixo nível de investimentos e da produtividade são entraves a um crescimento maior do país. Depois, no debate, disse que a economia brasileira não estava tão bem quanto parecia há alguns anos, mas que a situação atual também não é tão ruim como o humor dos mercados indica.