Numa fria manhã da primavera de 1996, no anfiteatro do campus de Santa Cruz da Universidade da Califórnia, assisti atento à disputada palestra de Scott Mc-Nealy, à época CEO da Sun Microsystems, empresa que criou a tecnologia Java, quando ele insistia em afirmar: "o computador é a rede". Saí dali convicto de que era a hora de aprumar o leme da Infox em direção a Java, mas também preocupado com o futuro da SCO, empresa parceira que organizava aquele fórum e responsável pela distribuição SCO Unix.
Poucos anos depois, o crescimento do Linux enfraqueceu a SCO e passamos a adotar aquele sistema operacional de código aberto em nossos projetos, adaptando-nos à perda da confortável receita originária das vendas das licenças do SCO Unix, parcialmente recomposta pela prestação de serviços de suporte, treinamento e mentoring para Linux e Java.
O mesmo se deu com o banco de dados que adotamos durante anos, aos poucos substituído por MySQL e PostgreSQL, ambos free softwares. Fizemos, portanto, opção deliberada por usar e convencer nossos clientes - públicos e privados -, a adotarem software livre, proporcionando economia e adicionando ganhos de qualidade, desempenho e confiabilidade. Tal economia tem permitido que o cliente invista mais e melhor em desenvolvimento de sistemas e serviços de suporte, ou seja, no núcleo do nosso negócio.
Foi por essas razões que compreendemos, assimilamos e nos incorporamos facilmente às políticas públicas dos governos Federal e estaduais, que estabeleceram a preferência pelo software livre nas contratações de produtos e serviços de Tecnologia da Informação (TI). Ao longo dos últimos 15 anos, temos colecionado projetos desafiadores e vitoriosos, todos eles adotando software livre, quebrando mitos e preconceitos e proporcionando enormes economias para os clientes.
Dentre tantas, merece destaque a experiência de construção do Creta - Sistema de Processo Digital para Juizados Especiais Federais, contratado pelo TRF 5a Região, baseado em Recife, premiado nacionalmente e reconhecido como a mais efetiva solução de processo eletrônico para o judiciário brasileiro. A base de dados do Creta na Seção Judiciária do Recife armazena hoje o conteúdo de 325 mil processos, ocupando 1,1 Tb e suportando até 800 sessões simultâneas de usuários acessando a aplicação. Qual o custo para o cliente na aquisição dos produtos envolvidos (Linux, Java, JBoss e PostgreSQL)? A resposta é zero. Se, contudo, a opção fosse por softwares proprietários, ultrapassaria a cifra de R$ 10 milhões!
A partir da experiência do Creta, com o apoio do TRF 5a Região, ousamos construir um sistema mais abrangente, capaz de atender toda a demanda do judiciário, tornando eletrônicos - ou virtuais, ou digitais -, todos os processos, independentemente de classe e de instância. E assim nasceu, em menos de dois anos, o PJe - Processo Judicial Eletrônico, padronizado nacionalmente pelo CNJ e em adoção por tribunais federais e estaduais.
Alguns dirão que zerar o custo de aquisição não significa eliminar o custo total de propriedade (TCO), e é verdade. Em torno do software livre existe um crescente número de empresas provedoras de serviços - a exemplo da RedHat -, que vendem treinamentos, mentoring e subscrições anuais que garantem suporte técnico nos mais diferentes níveis. Dificilmente, contudo, o TCO de um software livre será superior ao do equivalente software proprietário.
O relato dessa experiência concreta não tem a intenção de alimentar o ultrapassado debate ideológico e maniqueísta que se estabeleceu em torno da adoção do software livre, mas chamar a atenção para uma oportunidade que se abre onde muitos ainda vêem uma ameaça e, adicionalmente, alertar para o inexorável crescimento da adoção do software livre como opção consciente de empresas e usuários de TI, sobretudo diante dos muitas vezes abusivos preços das licenças dos softwares proprietários.
(artigo publicado na edição 36, em julho de 2011, da revista Tecnologia da Informação: http://www.mflip.com.br/pub/assespro/?numero=36)
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