segunda-feira, 26 de setembro de 2011

O apagão de mão-de-obra especializada


     O crescimento da economia mundial trouxe uma consequência que atinge atualmente muitos países, inclusive o Brasil: a carência de mão-de-obra especializada, sobretudo nas atividades técnicas e tecnológicas, aí incluídas as engenharias, a computação e suas respectivas carreiras técnicas de nível médio.
     Na área de Tecnologia da Informação (TI), embora o setor empregue atualmente 600 mil profissionais no país, apresenta déficit de cerca de 90 mil especialistas, de acordo com projeções do Observatório Softex. Mantida essa tendência, o déficit poderá chegar a 200 mil em 2013. Adicionalmente, de acordo com a Brasscom (associação que reúne empresas de TI de perfil exportador), apenas 85 mil estudantes concluem, em média, os cursos superiores de TI, de um total de 460 mil vagas oferecidas anualmente pelas instituições de ensino.
     Com as engenharias o cenário é igualmente desalentador: são 197 mil vagas oferecidas e somente 120 mil preenchidas nos vestibulares. Já o número anual de graduados (dados de 2010) são, comparativamente, assustadores: 



Engenheiros formados/ano     
PaísFormados    
China400 mil
Índia250 mil
Rússia100 mil
Coréia do Sul80 mil
Brasil32 mil











     Mas a que se deve tamanho desinteresse e o que justificaria uma evasão que chega a ultrapassar 80%? As causas são diversas, mas destaco duas: a ilusão que está por trás da busca pelas carreiras de Estado e a falta de base matemática na escola regular, reflexo do investimento anual em educação por estudante, que é aproximadamente quatro a cinco vezes menor do que a média dos países da OCDE para a educação básica e 20% maior na  educação superior.
     Sobre a ilusão das carreiras de Estado, temos aí uma perversidade: motivados pela estabilidade do emprego e pelos salários absurdamente elevados, os jovens são pressionados pelas suas famílias a buscarem cursos que favoreçam a participação em concursos públicos (sobretudo Direito, com 1.240 cursos no Brasil e 1.100 no resto do mundo, conforme pode ser visto em http://migre.me/5MAvT). Resultado: 1 em cada 1.000 vai concretizar esse sonho, enquanto os 999 restantes vão engrossar a massa de subempregados frustrados. E onde está a perversidade? Exatamente no desperdício de tantos jovens talentosos, essenciais nas engenharias e com grande potencial para o empreendedorismo, que são vistos ocupando as monótonas carreiras de Estado.
     A realidade do ensino médio profissionalizante é ainda pior: a falta de investimentos públicos nas últimas décadas levou o Brasil a uma situação negativamente singular. Enquanto nos países ditos desenvolvidos tem-se 1 profissional de nível superior para cada 5 de nível médio, em nosso país são 2 de nível superior para cada 1 de nível médio. Felizmente os governos Lula e Dilma vêm buscando corrigir esta distorção com a construção de 214 novas escolas técnicas federais que já começam a se somar às 140 unidades construídas entre 1909 e 2002.
     Esse cenário se agrava a cada ano e contribui para elevar as (já não poucas) dificuldades para cumprir os cronogramas dos dois megaeventos esportivos (Copa 2014 e Jogos Olímpicos 2016).


Leituras complementares:
A inversão de valores e a importância da engenharia - Milton Golombeck - http://migre.me/5PtpJ


domingo, 25 de setembro de 2011

Um pouco dos encantos do Chile


O Chile é um país admirável e em vários aspectos se diferencia, para melhor, dos demais da América do Sul. Dentro do contexto da América Latina, é o melhor em termos de desenvolvimento humano, competitividade, qualidade de vida, estabilidade política, globalização, liberdade econômica, baixa percepção de corrupção e índices comparativamente baixos de pobreza. Também é elevado o nível regional de liberdade de imprensa e de desenvolvimento democrático. Sua posição como país mais rico da região (empatado com o México), em termos de produto interno bruto per capita (a preço de mercado e paridade do poder de compra), no entanto, é contrariada devido ao seu alto nível de desigualdade de renda, medido pelo coeficiente de Gini. Em maio de 2010 o Chile se tornou o primeiro país sul-americano a aderir ao restrito clube da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Sua bela capital, Santiago, com população superior a 6 milhões de habitantes, é uma das cidades mais modernas da América do Sul. Entre seus atrativos estão inúmeros parques, museus, igrejas e uma intensa vida noturna. Via www.booking.com nos hospedamos no excelente Radisson Plaza Santiago Hotel, com diária de pouco mais de US$ 120, localizado num moderno distrito de negócios em Las Condes.
Chegamos no começo da tarde de uma quinta-feira e decidimos almoçar nas redondezas do hotel, na Churrasqueria Bariloche, casa de carnes com mesas na calçada e chopp gelado, que serviu um delicioso bife de chorizo. Depois de um necessário descanso no hotel, fomos jantar no Borde Rio (www.borderio.cl), centro gastronômico formado por 11 restaurantes das mais diversas especialidades. Escolhemos o estiloso Delmónico, de cozinha americana contemporânea, com decoração inspirada em New Orleans, onde saboreamos uma deliciosa pasta acompanhada do nacional Montes Alpha Shiraz. Foi aí que conhecemos o pisco sour, um drinque preparado à base de pisco (aguardente peruana feita de uva) e suco de limão com outros ingredientes. A máxima “aprecie com moderação” nos pareceu extremamente adequado para a bebida.
Centro de Santiago: o velho e o novo
A poucos metros do hotel existe uma estação do metrô, que utilizamos no segundo dia, dedicado a caminhadas pela cidade. Descemos nas imediações de Cerro San Cristobal, parte do enorme Parque Nacional, que possui Jardim Zoológico e Jardim Botânico. Para chegar ao topo da montanha toma-se o funicular (veículo que sobe a montanha preso em cabos sobre um plano inclinado)  e chega-se à estátua da Virgem Imaculada Conceição, de 22m. A visão de 360° da cidade é belíssima, local ideal para muitas fotos.
Nas proximidades da entrada do parque está um dos endereços mais procurados pelos turistas que visitam a cidade: La Chascona, a casa onde morou Pablo Neruda, ganhador do Prêmio Nobel e mais famoso poeta chileno. Fizemos o tour guiado pela charmosa casa, hoje um museu, para conhecer melhor esse adorável poeta, símbolo da esquerda latinoamericana, e perceber seu fascínio pelo mar que inspirou a arquitetura dos ambientes, como se fossem espaços internos de um barco. Visitar La Chascona permite também entrar no universo da relação de Neruda com Matilde, sua terceira mulher, para quem o poeta construiu a casa. Além disso, tem um gostinho especial as referências a Oscar Niemeyer, Vinícius de Moraes e Jorge Amado, amigos brasileiros de Pablo Neruda.
Um dos espaços de La Chascona, casa de Neruda em Santiago
A pé, seguimos pela Calle Constitución, em Bellavista, bairro conhecido como boêmio e cultural  e famoso pelos muitos bares e restaurantes. Paramos na Sangucheria Ciudad Viega (www.ciudadvieja.cl), que oferece dezenas de marcas de cervejas, onde provamos algumas das fabricadas no país. De lá caminhamos até o Mercado Central (o tempo esquentou e teria sido melhor ter tomado o metrô), famoso pelos vários restaurantes que oferecem frutos do mar. O inconveniente é o assédio de garçons desde as imediações do Mercado, prática sempre desagradável e irritante. Comemos o peixe mais famoso da região, o congrio, feito sem muito capricho.
Em seguida caminhamos pelo centro da cidade, com paradas na catedral e no Palácio de La Moneda, sede do governo. À noite optamos por uma área famosa por badalados bares, a Orrego Luco de onde seguimos para jantar no California Cantina & Restaurante (www.californiacantina.net), que fica nas imediações da Calle Providencia. O vinho escolhido foi o Santa Ema reserva, que nos surpreendeu e voltamos a tomar em outras ocasiões, inclusive no Brasil.
Para o restante do roteiro - visita a vinícola, a Viña del Mar e Valparaiso - optamos por alugar um carro, mas não foi fácil encontrar assim, de última hora. Depois de várias tentativas, finalmente a Alamos tinha um sedan compacto com GPS a preço razoável. Fomos, então, visitar a vinícola Concha y Toro (www.conchaytoro.com), que fica nos arredores da cidade. Depois de alguns transtornos com o GPS, finalmente chegamos à vinícola e fizemos o tour Marquês de Casa Concha, que inclui degustação de 4 tipos desse que é um dos melhores vinhos da casa.
No fim da tarde fomos ao Parque Arauco, belo shopping center com uma praça aberta, em torno da qual existem vários restaurantes. Escolhemos a varanda de um deles para aproveitar e apreciar a lua cheia, enquanto artistas locais tocavam bons hits no palco instalado no centro da agitada praça.
O domingo, penúltimo dia da viagem, foi dedicado a Valparaiso e Viña del Mar, viagem agradável de 120 Km. Valparaíso faz por merecer o título de patrimônio da humanidade. Para fugir dos ataques piratas, comuns no século 16, os moradores construíram as casas em morros, de onde se avista o mar como se fossem cartões postais. A cidade também tem uma outra casa de Pablo Neruda, visita obrigatória. Em 1959, o poeta chileno procurava por um lugar onde viver e escrever com tranquilidade. Neruda encontrou La Sebastiana, batizada assim em homenagem a seu construtor, Sebastian Collado. São cinco pavimentos, pequenos, mas sempre originais, igualmente inspirados em um barco, em cujos diversos ambientes estão dispostos móveis e objetos que o poeta e diplomata trazia das mais diversas partes do mundo.
Valparaiso, vista de La Sebastiana
A poucos quilômetros de Valparaiso, está Viña del Mar, balneário mais sofisticado, cheio de prédios a beira mar, lojas, bares e restaurantes. Depois de cumprir o ritual de molhar os pés nas águas do Pacífico - ainda mais geladas porque o dia estava frio -, paramos num restaurante mexicano e fomos para o elegante Chez Gerald (www.chezgerald.com), com vista maravilhosa para a praia.

Foram quatro dias desbravando um pouquinho da diversidade chilena, marcante tanto do ponto de vista climático, quanto humano. Impressiona perceber como os chilenos conseguiram vencer as adversidades geográficas, o relevo acidentado, a instabilidade sísmica e o clima, tornando-se um país que é referência para os vizinhos da América Latina. E para aqueles que querem experimentar a neve, nas proximidades de Santiago está a famosa estação de ski do Valle Nevado, excelente opção para uma viagem de inverno. Enfim, um destino que vale muito conhecer.

Jorge Santana & Eloisa Galdino, em março de 2011