quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Reflexões tecnológicas pela passagem de Steve Jobs


A perda neste 05/10/2011 de Steve Jobs, co-fundador da Apple (empresa de maior valor de mercado do mundo atualmente) e precisamente definido como visionário, produziu as mais diversas análises e considerações sobre a indústria da tecnologia da informação (TI) e me estimularam a fazer minhas próprias reflexões (talvez provocações).
Primeira delas: apesar de estranhamente não ter visto em lugar algum, tenho certeza de que a maior fonte de inspiração de Jobs foi Akio Morita, o discreto executivo da japonesa Sony que tornou a empresa líder do segmento nos anos 80/90, partindo da estratégia de "criar" necessidades. Em seu livro, Made in Japan, ele conta como destronou a holandesa Philips com gadgets como o discman.
Mas Jobs foi além de Akio. Ele "criou" necessidades (nunca teria valorizado nem encomendado pesquisas de mercado para identificar gostos, necessidades e tendências) e, ao mesmo tempo, apostou suas fichas em design e usabilidade (as interfaces tinham que ser sempre intuitivas), sem abrir mão de tornar seus produtos fashion, símbolo de status, objeto de desejo de legiões de consumidores. Sem ter que inventar, ele deu roupagem especial e singular a produtos que já existiam, desde o mouse até o leitor de MP3, sem esquecer do tablet. Aliás, o conceito de tablet não é novo: no final dos anos 80 vi um especialista da IBM na Fenasoft, Rio de Janeiro, apontando como tendência para a próxima década dispositivos do tipo prancheta. Desde então, várias tentativas de produzir tablets foram rejeitadas pelo mercado, até que Jobs enxergou ali a oportunidade de criar uma nova necessidade: a de sofisticar o simplório Kindle da Amazon, que houvera antecipado-se à Apple.
Se introduzirmos nessa receita um último, mas não menos importante ingrediente, o carisma pessoal de Jobs, o resultado não seria outro: a liderança de mercado em um segmento altamente competitivo, que tem feito a concorrência comer poeira. Não se pode desconsiderar, contudo, os dois pilares do modelo de negócios da Apple: a verticalização (a empresa produz tudo, hardware e software, mesmo via terceiros) e a propriedade (tudo é caixa-preta). Digo isso para fazer o contraponto com as tecnologias livres (abertas, não-proprietárias),  nas quais tem apostado um outro gigante, a Google. Mas essa é outra conversa, assunto para próximas reflexões.
Outra coisa: as comparações que estão sendo feitas entre Jobs e Bill Gates (fundador e chairman da Microsoft), são impróprias. Bill construiu diferente trajetória empresarial, igualmente hegemonista e também baseada em padrões fechados, mas apostando com significativo êxito no mercado corporativo (software e serviços para ambientes computacionais de médio e grande portes). O largo espectro dos produtos da Microsoft variam de jogos eletrônicos até gerenciadores de bancos de dados, razão pela qual a gigante disputa, ombro a ombro, o segundo lugar com a não menos importante IBM.
Carisma, talento, irreverência e visão de futuro à parte, acredito que Steve Jobs foi, antes de tudo, um genial businessman. Deixa sua marca e entra, pela porta da frente, na galeria daqueles que contribuíram para o progresso da humanidade.


7 comentários:

  1. Parabéns pela reflexão. Alguns tempo atrás fiz a leitura de um livro de Jobs só para poder dar aula de usabilidade. Ele queria dar aos produtos da Apple "a" perfeição

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  2. Ele seguramente ia muito além do "homem de negócios", era um agente criativo e tinha mais de 300 patentes em seu nome. Era obsessivo com estética e com design, nos mínimos detalhes.

    Foi homem de negócios ao ver o Apple I criado por Wozniak e não deixá-lo distribuí-lo gratuitamente. Foi gênio ao lançar o Apple II.

    Foi homem de negócios ao visitar a Xerox e ver a interface gráfica e o mouse. Foi gênio ao lançar o Macintosh.

    Foi homem de negócios ao reintegrar a Apple a equipe do Newton "MessagePad" que tinham sido demitidos. Foi gênio ao lançar o iPad.

    Outro dia li um relato de um ex-funcionário da Apple (hoje líder G+ no Google) que recebeu uma ligação do próprio Jobs em um domingo de manhã, porque um ícone estava com o amarelo errado. Jobs já tinha reunido um monte de gente para trabalhar no domingo para cuidar da questão.

    O Steve Jobs "reality distortion field" era famoso, bastava ele alardear um conceito ou tecnologia e estes passavam em instantes a serem as coisas mais fantásticas do mundo.

    Faltou ao lançamento do iPhone 4S, justamente isso. É um bom produto, com novidades. Se Jobs estivesse no palco, não teria sido tão criticado.

    A avaliação de Jobs do Kindle foi terrivelmente errada:

    'It doesn’t matter how good or bad the product is, the fact is that people don’t read anymore. Forty percent of the people in the U.S. read one book or less last year. The whole conception is flawed at the top because people don’t read anymore.'

    O Kindle vendeu horrores e além criar novos leitores, fez as pessoas que gostam de ler, lerem ainda mais!

    A Apple passou muito tempo cativando a todo custo os profissionais de arte gráficas e editoração, fazia tudo que eles pediam. Era o grande nicho da Apple. É a origem dos seguidores fiéis.

    Hoje não é mais assim, o modelo de negócios superou a opinião dos usuários. Não adianta os usuário dizerem que querem leitores de Blu-ray, são ignorados. Nem adianta pedir um drive de cartões de memória no iPad.

    A Samsung está fazendo a festa nessa intransigência, cópia os produtos da Apple mas dando mais ouvido aos usuários.

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  3. Boa reflexão, Jorge. É realmente difícil comentar o sucesso e êxito de Steve Jobs, trata-se de um fenômeno multicausado: homem certo, no local certo, na hora certa. Era o homem certo: suas características pessoais (carisma, liderança, conhecida mão-de-ferro, disponibilidade, paixão e atenção à detalhes) certamente tiveram um papel fundamental. Tem um artigo bem interessante de um ex-funcionário responsável por mobile apps na Google sobre uma ligação de recebeu de Jobs num domingo (https://plus.google.com/107117483540235115863/posts/gcSStkKxXTw) que resume parte dessas características. Era tb o lugar certo: provavelmente nem Jobs conseguiria triunfar numa empresa esquizofrênica como a HP ou descentralizada como a Google. Na Apple, ele se cercou (outro de seus traços: saber escolher muito bem sua equipe) de pessoas geniais como o próprio Tom Cook e o designer Jonathan Ive e a própria filosofia da empresa, q se confunde com a sua, facilitaram muito o seu trabalho. Por último, estava no momento certo: na década de 90, início do século XXI, vivíamos um momento em que as estratégias gerenciais que fizeram as mega empresas de TI dominarem o mundo (a AOL comprou a Time-Warner, e não o contrário!!!) começava a bater pino e o modelo "Jobsiano" de negócios se adaptou muito bem a uma geração de consumidores ainda sedentos por super-heróis, pop stars ou gurus q iluminassem o caminho e ditassem o que eles devem querer. Li em alguma das milhares de resenhas sobre a Apple por esses dias um comentário que achei interessante. O autor, que infelizmente não lembro (fato que se encaixa muito bem com meu argumento hehehe) afirmava que a morte de Jobs nos colocava verdadeiramente no século XXI, uma época em que não existem mais indivíduos e as grandes corporações (vide Google) ou coletivos de pensadores (vide filosofia wiki) tomam o lugar de pessoas identificáveis; o próprio conceito de autoria se relativizou.

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  4. Realmente...

    "Sem ter que inventar", ele dava um toque especial ao que fazia.

    Foi de arrepiar ler o que o fundador do Google, um dos principais concorrentes, disse:

    ‎"Steve, sua paixão pela excelência pôde ser sentida por qualquer um que já tocou um produto da Apple – inclusive o MacBook, do qual estou escrevendo neste instante." (Sergey Brin)

    Compareci a uma edição da FENASOFT, em 1994. Nesse ano, ela ocorria em São Paulo. Lembro de como fiquei maravilhado de poder ver um Machintosh de perto!

    Sempre fui admirador do perfeccionismo de Jobs, mas também sempre fui contra a sua mania de manter tudo fechado, proprietário. Detestava a idéia de um computador Machintosh ter processador diferente com conjunto de instruções diferentes, onde só era possível usar um único S.O.! Mas ao mesmo tempo ficava impressionado como ele conseguia sempre casar o melhor hardware com o melhor software, elitizando seus produtos!

    Tomara que não demore muito para que que outro Jobs surja, revolucionando novamente o mundo!

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  5. O mundo gira nos céus, mas, para humanos acontece na terra...
    Alguns homens fazem acontecer coisas do Céu aqui na terra.
    Perdemos um cedo demais, já perceberemos isso!
    Mas o céu esta ao alcance de todos, não tem preço, basta estar conectado pra alcançar.
    Sou convicto que nasceram e nascerão outros tantos que se destacarão como Steve Jobs. Cada um com sua importância.
    Se é que já não existem alguns crescidinhos andando por ai, ñ é?
    Percebendo a importância que esse homem teve nos avanços tecnológicos universais, criando os mais irresistíveis símbolos de status para estar conectado, tornando um simples individuo em um amigo do mundo.
    Eu pergunto: Quem se conectará ao Céu para criar um símbolo de status num mundo da forma como se apresenta para um futuro tão eminente?
    Ótima provocação.
    Meus cumprimentos.

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  6. Acima de tudo, agradeço a Jobs por ter facilitado a vida neste século.

    Pouco me importa o que ele errou ou acertou. Eu apenas reconheço que foi Jobs que arriscou e, acima de tudo, soube construir sonhos.

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  7. Excelente essa reflexão sobre Steve Jobs. Complementando o que já foi escrito aqui, considero como principal contribuição de Mr. Jobs a simplificação da informática, tornando-a acessível não apenas aos especialistas, mas, especialmente, aos leigos.
    Esta é uma lição que ele deixou a todos os que dedicam-se ao desenvolvimento de software e hardware. A vida já é suficientemente complicada e a TI tem o dever de torná-la mais simples. Isto vale tanto para indivíduos quanto para organizações.
    Jobs mudou o paradigma de interação homem-máquina, tornando as interfaces mais intuitivas e a informática menos sisuda, com produtos mais bem acabados. Desta forma, uma variedade de produtos, de diversos fabricantes, foram criados, inspirados no paradigma criado pela Apple. Assim, tarefas cotidianas como navegar na Internet, enviar e-mails, ouvir músicas, relacionar-se com outras pessoas, ler e escrever textos tornaram-se mais simples e acessíveis a pessoas das mais variadas faixas etárias, graus de instrução e classes sociais.
    A passagem de Steve Jobs não deve colocar um ponto final no seu legado, mas provocar reflexões como esta e fortalecer os valores criados por ele.

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